Cultura

Refugiados encontram novos horizontes proporcionados pela educação pública em Goiás

No primeiro semestre de 2015, os irmãos Nassim (24 anos) e Lilian Moussa (29 anos), acompanhada de seu marido Alaa, desembarcavam no Brasil, deixando para trás todo um cenário de desolação em seu país de origem, a Síria. Envolta em uma série de conflitos desde o início dos anos 2000, quando Bashar al-Assad sucedeu o pai na condução política, a Síria já registra mais de 400 mil mortes de civis, divididos entre rebeldes e defensores do regime político. Segundo a Organização das Nações Unidas, mais de 4,5 milhões de pessoas já buscaram asilo em outros países, fugindo das áreas de conflito.

Para a família Moussa, a escolha pelo Brasil foi motivada pela presença de familiares que já haviam se estabelecido por aqui anteriormente, como o irmão mais velho. Conforme explica Lilian, o Brasil tem sido mais aberto à recepção de refugiados sírios. “Não encontramos nenhuma dificuldade em obter o visto”, alega Lílian. Hoje, os três irmãos estão unidos em solo brasileiro, mas compartilham a saudade de terem deixado para trás os pais, moradores da cidade de Maschta al Helu, que não está no epicentro dos conflitos.

Antes de se estabelecerem no Brasil, os irmãos viviam na capital Damasco, e conviviam diretamente com os horrores proporcionados por uma guerra civil, que tomou proporções mundiais, inclusive dividindo no campo de batalha Estados Unidos e Rússia. “Presenciei inúmeros conflitos e cenas que não gosto de me recordar. Vir para o Brasil foi uma questão de sobrevivência. Ninguém escolhe deixar seu país deliberadamente, a menos que não encontre mais meios de se manter em segurança”, relata Nassim.

Novas perspectivas

Ao escolherem a cidade de Anápolis, os irmãos tiveram contato com a oportunidade oferecida pela Universidade Estadual de Goiás (UEG) para refugiados interessados em investirem em sua formação, por meio de um processo seletivo diferenciado e exclusivo para eles. Foi assim que a jornalista síria Lílian optou por fazer sua segunda graduação, dessa vez, o curso de Letras. Ciente de suas dificuldades com a língua portuguesa para atuar no jornalismo, Lílian buscou um curso que está lhe permitindo evoluir na aquisição do novo idioma, muito diferente do árabe.

Enquanto isso, o irmão Nassim, que possui curso técnico de informática, optou pela graduação em Sistemas de Informação. Ambos aprenderam o português de forma autônoma e dizem não encontrar dificuldades para se adaptarem à nova cultura. “Os brasileiros são muito receptivos. Estamos 100% inseridos nos costumes locais, inclusive nos hábitos alimentares. Eu só não sou muito fã de feijão, mas fora isso, aprecio a comida brasileira”, brinca Lílian.

Terreno fértil para o desenvolvimento pessoal

Os irmãos Nassim ingressaram na UEG pelo primeiro processo seletivo para refugiados organizado pela instituição, no ano passado. Ao todo, nove estudantes na mesma condição conquistaram sua vaga, e hoje buscam mudar suas realidades por meio do poderoso auxílio da educação. Em 2017, foram destinadas 140 vagas exclusivas para refugiados, o que representa uma vaga em cada um dos cursos da universidade, dedicadas aos imigrantes que possuem visto humanitário ou status de refugiado.

Conforme explica o assessor de relações internacionais da UEG, Rodrigo Sobreiro, as vagas deste processo seletivo especial não são contabilizadas como de ampla concorrência, mas foram criadas mediante uma constatação da universidade sobre o seu papel de contribuir para a inserção cultural e intelectual de comunidades abaladas por questões humanitárias. “A universidade tem que estar aberta a acolher todos os perfis de estudantes. E para isso, criamos um processo de seleção mais condizente com a realidade dos refugiados. Hoje, temos estudantes vindos da Síria, do Haiti e de Guiné Bissau”, informa.

Para promover a adaptação dos imigrantes ao novo idioma, a UEG criou o curso de português para estrangeiros, oferecido inicialmente no campus de Anápolis. Mas já está em estudo a sua ampliação para demais unidades, como a da capital. Conforme explica o assessor internacional, a partir do momento que os refugiados ingressam na universidade, passam a ter acesso a todos os benefícios oferecidos aos demais alunos como bolsas de estudo e a programas de fomento à pesquisa e extensão.

São candidatos a esse processo seletivo especial, os imigrantes que possuem o status de refugiado, concedido pela Polícia Federal; ou aqueles que possuem visto humanitário.

Anderson Alcantara

Jornalista e Escritor

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